O SOLDADO DA BORRACHA

A partir deste domingo,o site, o O POVO DO ACRE vai publicar uma série de entrevistas dos soldados da borracha, concedidas no ano de 1999 ao blog, Raízes Tronqueiras.

Todos os entrevistados já faleceram. Vale apenas conferir o que eles falaram sobre a saga dos nordestino que vierem para o Acre convocados pelo governo brasileiro produzir borracha nos seringais nativos da Amazônas.

A entrevista de hoje é com o cearense,Rodrigues, (in memoriam).

MAIS RESPEITO A ESSES COMBATENTES DE SELVA!

” Guerreiros são pessoas, são fortes são frágeis”

O depoimento desta semana é do Cearense José Rodrigues, com 91 anos de deidade. Zè Rogrigues como é conhecido, deixou a família e uma mulher para atender a convocação do governo Brasileiro na segunda guerra mundial. Entre ir para o combate direto com o exercito Nazista e seus aliados, ele optou pela guerra na selva amazónica com as cobras onças e a truculência dos “coronéis de barranco”. Zé Rodrigues ficou muito conhecido no seringal Alagoas, onde trabalhou maior parte do tempo, como um negro valente destemido.

O que mais o caracterizava era sua habilidade e frieza na hora de enfrentar um uma briga. Contam os antigos que ele deixou sua fama na região como um dos arigós mais valentes, tendo inclusive participado do movimento de serinigueiros contra carestia da mercadoria e o baixo preço da borracha, movimento esse, que se convencionou chamar de REVOLTA DE ALAGOAS, reprimida com força e crueldade pelo Exercíto.

Conheci Zé Rodrigues em 1985 quando participava de uma reunião no Bairro Ipepaconha para Organizar a associação de moradores da comunidade. mesmo Já quase cego, estava sempre rindo e contando piada. Hoje vive prostrado dentro de uma rede, contudo não perde o humor quando aparece alguém para conversar, está sempre com um radinho de pilha no ouvido para saber o que está se passando no Brasil.

Seu depoimento.

“Eu vim para o Acre, porque eu era alistado no exército, aí quando a guerra começou, começaram a chamar gente, na época eu tinha casado a pouco tempo em 1942, naquele momento eu não vim, quando foi em 1943, me chamaram de novo, eu não queria vim aí meu irmão disse: vá essa já é a 2ª vez que você é chamado, daí eu decidi vim. Só que eu não queria que minha mulher soubesse daí eu tive que sair fugido dela porque não tive coragem de me despedir”.

Na época veio eu e mais dois irmãos, isso era em Fortaleza, só que nós morávamos no Sertão, na serra, quando nós chegamos para pegar a farda o comandante disse: vocês têm duas escolhas, ou vão para a linha de frente da guerra ou então como soldado da borracha. Nós saímos em três de Março de 1945 no navio chamado Taibé, um navio da Alemanha, quando nós íamos saindo o comandante do navio disse: – “se peguem com Deus porque eu já voltei 2 vezes do meio do Oceano devido os submarinos e os aviões de guerra, agora eu não volto mais”.

Quando foi umas horas da noite o navio ia puxando 25 milhas, daí eu dormi, quando eu me acordei foi pelos gritos, que eu olhei tava pretim de Padre e irmã na proa do navio rezando pedindo a Deus proteção, tinham dado 3 tiros de canhão no nosso navio, a sorte foi que Deus ajudou e não pegou. Quando nós chegamos em Belém, quem vinha para o Acre tinha que jurar a Bandeira, e eu fiz isso bem pertinho de Getúlio Vargas e eu assinei um contrato de 3 anos.

Daí nós pegamos o navio chamado Índio Brasil e se jogamos para o Acre, eu disse logo aos meus irmãos: já que nós estamos aqui eu vou bater onde o sabão não lava. Quando eu cheguei aqui a coisa era preta, começou pelas dificuldades nas estradas, Agente não sabia cortar seringa, os bichos que tinham na mata, as doenças, acordar de 1 a 2 horas da manhã, e ainda mais, se agente desse um tiro a noite esturrava onça para todo canto. Uma vez eu me topei de frente com uma onça, e a bicha me encarou ai eu apontei a espingarda e apertei o dedo, só que eu furei a espoleta e a bicha não disparava, eu joguei ela de lado peguei a faca e disse: – “o risco que corre o pau corre o machado”, ela pulou em riba de mim, eu pulei de lado e finquei a faca, ela correu de mata a fora que eu só escutava a quebradeira na mata.

Era muito difícil a nossa vida aqui, Agente trabalhava muito e nunca dava pra pagar ao conta. pra eu me aposentar como soldado da borracha deu o maior trabalho, isso porque minha casa pegou fogo e meus documentos queimaram tudo, inclusive minha carteira de soldado da borracha que servia como uma identidade. Mas graças a Deus eu consegui, hoje estou com 91 anos, cego devido a mordida de uma cobra papagaia que me mordeu no o olho direito. Construí outra família a mulher Já faleceu e nunca mais voltei ao meu Ceará.

Chagas Batista, nasceu nas barrancas do Rio Tarauacá- AC, é ativista do movimento social.

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